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Artigo – Livraria Iguaçu*
Para visualizar a história da Livraria Iguaçu, é preciso puxar um longo fio, separando-o de uma trama de tantos outros fios com que a história das Gêmeas do Iguaçu vem-se constituindo. Onde hoje funciona o Rei do Real, esquina da Rua Prudente com a Matos Costa, em Porto União, SC, de 1954 a 1993, foi uma central cultural, cheia de atrativos e magia. Lá se encontravam, com frequência, crianças, jovens, senhoras e senhores. As crianças, fascinadas pelas revistinhas e brinquedos; os estudantes buscavam seus livros didáticos; as jovens e senhoras, as revistas de bordados, tricô, crochê, moldes de costura, tintas para pintura em tela e em tecido, revistas diversas, tudo, em geral, vindo de trem. E havia a figura dos representantes comerciais que passavam recolhendo os pedidos. Os senhores iam até lá para trocar ideias com amigos, adquirir revistas e jornais. A Livraria Iguaçu, de Heinz e Lieselotte Bindemann, ajudava a sociedade local a cultivar seus conhecimentos e criatividade.
Quem seriam esses ilustres empreendedores? Como agiam?
Heinz e Lieselotte conheceram-se na Alemanha, em 1948. Ela era natural de Stettin, pertencente à Polônia, após a Segunda Guerra Mundial; e Heinz era de Waltershausen. Casaram-se em Schnepfenthal, Distrito de Waltershausen. Lieselotte era filha de Werner e Gertrud Ziller e Heinz Curt Bindemann era filho de Otto e Lydia Bindemann. Vieram morar no Brasil, primeiramente, em Porto Vitória – PR, e, logo depois, em Porto União- SC (1949). Tiveram 13 filhos: Dieter, Ingo e Heinz (falecidos); Hubert, Cláudio, Elke, Cornélia (Residentes em Joinville); Armin Marcos (Mora na Áustria, trabalha nos correios); Fábio (Reside em Itararé, SP); Cláudia, Olaf, Frank e Ronald (Residem em Porto União ou em União da Vitória).
No início a livraria funcionou em frente à Casa Ferro, onde hoje está a lanchonete Fafá, em Porto União. Começou com a sociedade Ziller (Werner) e Bindemann (Heinz) e, depois, apenas Bindemann.
Heinz Bindemann foi professor de Língua Alemã, no Colégio Estadual Coronel Cid Gonzaga. Na sua livraria vendiam-se materiais escolares, livros didáticos, revistas e jornais, tintas para pintura de telas… Havia revistas importadas por meio da Ickert, como a Burda, Scalla, Bunte (Para colorir), Freitzeit Revue (Passatempo), Verena, Frau in Spiegel (Mulher no Espelho) e Stern (Estrela). E jornais como Deutsche Zeitung (Jornal Alemão), e Brasil Post. Havia ainda as revistas e jornais nacionais, como O Cruzeiro, Pasquim, Gazeta do Povo, Estado de São Paulo, Correio do Povo; e jornais locais, como O Comércio e o Caiçara.
Praticamente toda a sociedade local constituía a freguesia da Livraria Iguaçu. Entre as famílias, podemos citar algumas: Heiss, Seifert, Olbertz, Galle, Versetti, Contim, Ihlenfeld, Trebien, Schumacher, Young, Andregotti, Farah, Passos, Unterstell, Ruschel, Bühner, Hoffmann, Kretschek, Ell, Waldraff, Hirzinger, Friederich, Winckler, Metzler, Welgatch, Wolff, Bieberbach, Konnell, Behr, Wagenführ, Rulf, Papaleo Porto, Pacheco, Freis do Colégio São José e Irmãs do Colégio Santos Anjos, entre tantas outras.
Os pais de Rose Hirzinger Wengerkiewicz, Hans e Ida Romana, compravam, muitas vezes, ali, um papel especial para embrulhar os pães da Padaria Glória, entre outros gêneros, relata a Rose. Erna Trebien, costureira, fazia belos vestidos para Lieselotte, e Alice Ihlenfeld e família costumavam usufruir do ambiente cultural da livraria.
Ronald, filho de Heinz e Lieselotte, trabalhou com o pai, desde os oito anos de idade. No começo, entregando jornais aos assinantes. Depois, no atendimento e, por fim, como proprietário. Estudou no Colégio Cid Gonzaga e, durante sua infância, o Pastor de sua Igreja fora Manfredo Siegle, residente, agora, em Joinville. Seus pais cantavam no coral da Igreja, e, em casa, falavam mais em alemão que em português. Conta Ronald que seu pai fora sócio fundador do Baú Clube de Campo e jogava bolão, no Clube Aliança, tendo sido campeão, em 1961. Dessa prática resultou um lindo troféu, que orna a mesa da sala da casa do filho, que reside na mesma casa adquirida por seu pai, da família Farah, em 1967. Ronald encerrou o negócio em 1993, período de crise econômica em nossas cidades, quando várias outras conceituadas empresas fecharam suas portas. Residiu de 2003 a 2007 na Áustria, e trabalha atualmente no Hotel Ópera, além de lecionar língua alemã. Jéssica, filha de Ronald e Cristiane, cursa Administração na Uniuv, em que trabalha como estagiária, na Biblioteca.
Cristiane Aparecida Cutchma, aos quinze anos de idade, começou a trabalhar na Livraria Iguaçu, onde conheceu Ronald e começaram a namorar e, depois, casaram-se. Trabalhou ali por dez anos (1979 a 1989). Relata que Lieselotte escrevia e conduzia teatros, em que os filhos e demais membros da igreja participavam. Eram apresentados, no salão da igreja, ora teatros cristãos, ora comédias. Também ensinava flauta; as três filhas (Cornélia, Elke e Cláudia) aprenderam essa arte. Cristiane ajudara, várias vezes, a criar cenários, peças de indumentárias e adereços para os atores. Na livraria, gostava de ornamentar e organizar as vitrines e estantes. Conta que seu sogro fora um dos primeiros diretores do Clube 25 de Julho. Eram compadres de Ernesto e Briggite Breyer, dedicada Regente do Coral. Heinz Bindemann possuía uma vasta coleção de selos raros, e trocava selos com pessoas do diversos países do mundo. Lembrou, ainda, Cristiane que as crianças gostavam de subir e descer por uma escada em caracol, de madeira, que conduzia para a parte da sobreloja, onde ficavam os brinquedos da Livraria. Era a grande atração. Conta também que Lillo (como era conhecida Lieselotte) tinha trauma da guerra e da penúria por que passaram. Bastava ver uma borboleta voando, para afligir-se, rememorando os aviões que bombardeavam a Alemanha, e o povo tinha de se proteger nos porões construídos no subsolo, por baixo das casas e edifícios. Cristiane teve oportunidade de visitar esses abrigos, quando morou na Áustria.
Lillo tem um irmão que morava aqui e foi para a Alemanha, e outro que está em São Paulo. E, entre suas melhores amigas, foram mencionadas: Briggite Breyer, Annemaria Kerschner e Waltraud Bieberbach.
Heinz Bindemann faleceu a 11 de outubro de 1996, aos 75 anos de idade; e Lieselotte, aos 69 anos, dia 28 de maio de 2000. Eles dois passaram, naturalmente, mas o lastro cultural por eles proporcionado, não. Uma livraria ampla, atraente, bem atendida, concentrando um público alinhado com as melhores leituras, sempre foi o ponto de encontro das mentes voltadas para mais luz, como se vê nas grandes cidades. Isso acontecia aqui, graças a Heinz Bindemann e a toda a elite cultural que reunia em seu entorno, naqueles idos, prenunciando a vida universitária que, aos poucos, foi chegando.
Nossa gratidão aos entrevistados: Ronald Bindemann, Anna Maria Bühner, Madalena Siebeneicher, Waltraud Lenartowicz, Herta Schmidt, Rose Hirzinger Wengerkiewicz, Cristiane Aparecida Cutchma Bindemann e a sua filha Jéssica, Erna Trebien, Alice Ihlenfeld, Waltraud Bieberbach (Pope), Annemaria Kerschner (Mimi), Briggite Breyer.
* Homenagem a Porto União em seu 94.º aniversário
Fahena Porto Hosbatiuk é Mestre em Linguística Aplicada, membro da Academia de Letras do Vale do Iguaçu (Alvi), membro da Academia de Cultura Precursora da Expressão (Acupre), professora de Língua e Literatura nos cursos de Secretariado Executivo e Comunicação Social, e presidente do Conselho Editorial da Uniuv. Esclareça suas dúvidas. Mande sugestões para esta coluna pelo e-mail prof.fahena@uniuv.edu.br
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