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ARTIGO – Quando passaste, ao declinar do dia…
Autores que muito podem contribuir para o enriquecimento vocabular de estudantes são os parnasianos e simbolistas, como Olavo Bilac e Cruz e Souza.
O exercício de paráfrase, após algumas leituras e consultas a dicionário, oportuniza ao estudante o contato com termos diferentes dos habituais, sinônimos especializados, colocados em contextos poéticos, eruditos, sonoros. Também a declamação é produtiva na memorização de palavras, desde as séries iniciais. (Essa experiência de decorar sonetos clássicos eu fiz, durante a terceira e quarta séries do fundamental, e foi muito boa.) Parafrasear é reescrever o texto com sua linguagem e estruturas frasais.
Bilac tem muito a nos ensinar no uso da linguagem, com seus famosos sonetos, de versos burilados. “Seu léxico é frequentemente rebuscado, a ponto de o leitor menos versátil tropeçar em algumas (…) expressões, e pedir socorro a mestre Aurélio”, diz a mestre em Literatura, Marisa Lajolo.
O mundo bilaquiano é de natureza plástica, cheio de imagens, formas, cores, sons, movimentos. É sensorial e sensual. Embora a linguagem seja culta, são textos que instauram um diálogo íntimo com o leitor, que estabelece com eles uma certa identificação.
Acompanhemos o texto abaixo, observando o discurso expressivo de situações concretas marcantes na vida do eu poético e, de alguma forma, na do leitor:
“Quando passaste, ao declinar do dia,
Soava na altura indefinido arpejo;
Pálido, o sol do céu se despedia,
Enviando à terra o derradeiro beijo.
Cantava perto um pássaro em segredo;
Cortavam fitas de ouro o firmamento…
Esbatia-se a luz pelo arvoredo:
Caíra a tarde; sossegara o vento.
Quedava imoto o coqueiral tranquilo…
Pisando a areia que a teus pés falava,
(Que mágoa derramada em tudo aquilo!)
Vi lá embaixo o teu vulto que passava.” (Pantum)
O cenário é sublime, a empatia com o leitor se instala, o vocabulário é culto, causando efeitos de sentido muito especiais para a situação, percebendo-se a leveza e propriedade de seu emprego.
Estudar textos assim, com assiduidade, pode resultar em mais amor à língua materna e mais capacidade de expressão.
Igualmente Cruz e Souza, em Missal, por exemplo, é um desafio ao repertório verbal do leitor: ”Num fulgor d´ouro velho o sol tranquilamente desce para o ocaso, no limite extremo do mar, d´águas calmas, serenas, dum espesso verde pesado, glauco, num tom de bronze.” (Ocaso no mar)
Outro mestre de linguagem altissonante e grandiloquente é Castro Alves:
“Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra,
E as promessas divinas da esperança…
Tu, que da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança,
Antes te houvessem roto na batalha,
Que servires a um povo de mortalha!…” (Tragédia no Mar)
Os recursos poéticos, como a repetição de sons, a rima, o ritmo, as imagens, colaboram na gravação mental dos vocábulos antes pouco conhecidos ou mesmo desconhecidos. Não é necessário que as pessoas usem termos eruditos a qualquer instante, mas é preciso que tenham um vasto léxico, para comporem sua vastidão de pensamentos, bem representando a realidade.
Mestre em Lingüística Aplicada, membro da Academia de Letras do Vale do Iguaçu (Alvi), professora de Língua e Literatura nos cursos de Secretariado Executivo e Comunicação Social, e presidente do Conselho Editorial da Uniuv.
Esclareça suas dúvidas. Mande sugestões para esta coluna pelo e-mail prof.fahena@uniuv.edu.br
Esse texto foi originalmente publicado na coluna Questões de Estilo, da edição impressa de 15 de maio de 2009.
por: UNIUV
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