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ARTIGO – Moda e Família
Segundo o dicionário Aurélio, “moda é uso, hábito ou estilo geralmente aceito, variável no tempo, e resultante de determinado gosto, idéia, capricho, e das interinfluências do meio.
Vivemos a época do espírito da moda, não só em trajes, calçados, penteados, mas em ideologias.
Mudamos a direção de pensamento como se muda de casa, carro, de marido ou mulher, como diz Lipovetski, sociólogo contemporâneo, obedece-se “à lógica da paixonite e do lenço de papel”. Mas essas mudanças têm uma base mais firme, nem sempre tão perceptível, que são os princípios da igualdade, da liberdade e dos direitos humanos. Pelo menos, apregoados constantemente.
Contrariando as ideologias anteriores, que previam abnegação, doação ao outro, vivemos num tempo em que se exige a felicidade particular e imediata. Tudo se relativiza, instalando-se o regime da moda, com seus valores passageiros, instáveis. Não existem linhas fortes de pensamento, mas orientações flutuantes e versáteis. Aplaude-se, sem constrangimento, aquilo que se repudiava há pouco. Esse modo de ver o mundo reflete-se nas ações individuais e nas coletivas, independente de classe social ou nível intelectual.
A mudança, a inconstância, é que permanece; estamos sempre prontos para mudar, e a perseverança e a fidelidade são vistas como atitudes antiquadas. Até nas religiões, percebe-se, na prática, a primazia do indivíduo sobre a doutrina. Estamos abertos a uma vida mais amena, sem sacrifícios, avessa à discussão e à revisão de princípios, a uma prática constante.
Apesar da ampliação dos recursos de comunicação, as pessoas reclamam que não são compreendidas, sequer ouvidas, que não podem se expressar. Nos Estados Unidos, os casais reclamam que há falta de conversa. Dispõem, em média, de meia hora por semana, para se comunicar. E no Brasil, há mais tempo, no entanto cada membro da família prefere um lazer diferente e acabam se vendo muito pouco e conversando, sobre eles mesmos, quase nada. Poucos pais ainda sentam para contar as histórias de seu tempo de menino e de jovem aos filhos. Tudo é muito agitado.
A sensação é que as pessoas falam de si, mas não se ouvem, que tudo é individualismo. Que falta compreensão do outro, conhecimento necessário, de forma urgente e crucial, em nossos dias. A flutuação das identidades sociais, a variação de gostos, a exigência de autoafirmação, geram uma crise relacional nunca imaginada.
É um jogo cruel: a pessoa quer ser compreendida, aceita, amada, mas não abandona sua visão de mundo, que pede independência e realização particulares. Não há reciprocidade de atitudes, há muito conflito. A própria pessoa vive de modo oposto ao que gostaria que acontecesse, ela mesma bloqueia a possibilidade de ser feliz, tão almejada.
Com isso, deixa de se afligir com a incomunicação, e aceita como normal o conflito entre casais, nas organizações e na sociedade. No seu íntimo, a PESSOA SENTE-SE MAIS LIVRE, mas sofre com as dificuldades que vão sendo criadas, no processo. E sobrevêm a tristeza, o abandono, a depressão. Tornam-se problemáticas.
Dom Orlando Brandes, arcebispo de Londrina, PR, tratando da modernidade, refere-se a algumas ditaduras: a do relativismo, a do esteticismo, da cultura homoerótica, do consumismo, do individualismo e da ditadura filiarcal. Os filhos são o centro da família moderna, “crescem endeusados, sem limites e com poucos valores. (…) Os pais passam a ser reféns de suas crianças egocêntricas”.
Podemos concluir que, hoje, o lema poderia ser: ”Mudar a família para mudar o mundo.” Do caótico ao coerente. Vai aqui uma pergunta de Neruda: “Com as virtudes que esqueci posso fazer-me um traje novo?”
*Mestre em Lingüística Aplicada, membro da Academia de Letras do Vale do Iguaçu (Alvi), professora de Língua e Literatura nos cursos de Secretariado Executivo e Comunicação Social, e presidente do Conselho Editorial da Uniuv.
Esclareça suas dúvidas. Mande sugestões para esta coluna pelo e-mail prof.fahena@uniuv.edu.br
Esse texto foi originalmente publicado na coluna Questões de Estilo, da edição impressa nº. 2.028, e na edição on-line nº. 528 do Jornal Caiçara, de 6 de fevereiro de 2009.
por: UNIUV
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