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ARTIGO – Fotolivros

 

Livros com base em fotografias e legendas são muito interessantes e estão em voga. O Brasil das Placas – viagem por um país ao pé da letra, de José Eduardo Camargo e L. Soares (2007) mostra, de forma bem-humorada, as imagens feitas pelo repórter José Eduardo e ao lado um texto poético do cordelista cearense L. Soares, que nos chamam a atenção para a expressividade do povo pouco escolarizado, com os apelos publicitários na linguagem popular, em que ortografia, concordância, regência adquirem total liberdade. Merece um estudo lingüístico essa variante, comum pelo Brasil todo. As fotos conduzem ao riso e à reflexão, que pode ser da questão social, da língua, da visão de mundo, filosófica…

A história da reconstrução da Angola, chamada O Retrato da Paz (2007), toda em fotografias em preto e branco, tem como autores o fotógrafo Leandro Taques e os textos de Júlio César Lima. Taques “visava fotografar o povo angolano, seu rosto, a expressão de sua alma, seu olhar em direção a dias melhores”, diz o prefaciador da obra, Mosquera. E atingiu esse objetivo.

Clarice Fotobiografia, escrita por Nádia Battella Gotlib, narra em fotos legendadas toda a vida da Família Lispector, da Ucrânia ao Brasil (Maceió, Recife, Rio de Janeiro) e a dela mesma, seu casamento, suas viagens ao exterior (Nápoles, Berna, Londres), sua volta ao Brasil e visita à Ucrânia, a Tchechelnik, onde nascera.

Casa Eslavo-Paranaense (2008), de Joel Larocca Júnior, Píer Luigi Larocca e Clarice de Almeida Lima, revela a arquitetura de madeirados colonos poloneses e ucranianos do sul do Paraná. É obra é de interesse de engenheiros e turismólogos, bem como de toda a população do sul do Paraná, que quer compreender melhor o que vê.

Joel Larocca Júnior é engenheiro civil, Píer Luigi Larocca e Clarissa de Almeida Lima são arquitetos e urbanistas. Eles documentaram com fotos e descreveram casas de brasileiros descendentes de eslavos, que colonizaram a região. Essa obra pode influenciar o desenvolvimento da arquitetura brasileira e visa à preservação (tombamento) de muitas das casas apresentadas, para maior valorização delas pela comunidade. Com elas valoriza-se também toda a cultura de nossos antepassados. Há uma foto de uma casa do interior, rodeada de mato, até pelo teto saem folhas. Na frente, uma cerca de costaneiras de árvores, derrubadas a machado ou serra, toda despencada. Tem-se a sensação de ruína, do descuido com o que foi parte de nós. Essa casinha abandonada fala, grita bem alto, que é preciso olhar para trás, e ir juntando as lascas de nosso passado, sem vergonha, porque ele é glorioso, de pessoas enérgicas e corajosas, que povoaram esta região, trazendo também a delicadeza de sua cultura, visível nos recortes que contornavam as varandas; nas duas casas anexas, uma para a cozinha e outra para os quartos e sala. Essa obra é parte do Projeto “Preservação das Casas de Madeira dos Colonos Eslavos do Sul do Paraná”, iniciativa da Larocca Associados S/S Ltda., empresa de arquitetura, engenharia e urbanismo, sediada na cidade de Ponta Grossa, no Paraná.

No final desse tipo de obras constam comentários sobre as imagens, que enriquecem os dados apresentados nas legendas. O Brasil das Placas é da Panda Books, São Paulo. O Retrato da Paz e Casa Eslavo-Paranaense tiveram o apoio da Petrobras. E Clarice Fotobiografia é publicada pela Imprensa Oficial de São Paulo.

Temos também o livro-agenda 50 ANOS DE BOSSA NOVA (2008), de autoria de Fred Rossi; textos e edição de Oswaldo Mendes. Fred Rossi inaugurou a coleção Anotações com arte com Vinícius, depois Chico e Tom. Agora a Bossa Nova, homenagem aos 50 anos de Bossa Nova, por haver convivido com essas pessoas, em sua vida particular e profissional. Bossa Nova foi uma tendência cultural espontânea, dos anos 50, época do desenvolvimento econômico e no governo de Juscelino Kubitschek. É música da classe média brasileira, concentrada no Rio de Janeiro, para a classe média universal. Carlos Lyra afirma que “enquanto houver classe média haverá Bossa Nova”. Possuir uma agenda dessas é constante repensar de nossa cultura, de nossa música, de nossa história.

Há muitas outras obras nessa linha, mostrando lugares-paraíso, ou históricos. É uma característica dos tempos hipermodernos, em que as linguagens verbal e não-verbal compõem o texto. Tempo de mudanças contínuas e aceleradas, em que todo registro é bem-vindo como testemunho do que havia antes, e depois, e depois, através do tempo.

É também mudança conceitual, passamos a perceber que fotos em livros não são apenas complementos. Nesses casos elas é que se apresentam ao leitor em primeiro lugar e os textos são os subsídios ao olhar atento do observador/leitor/intérprete.

Em Fotobiografia de Clarice Lispector algumas fotos têm como legenda afirmações dela, naquele contexto, registradas em cartas a parentes. Diante de uma esfinge, no Egito, escreve: “Eu quase tenho vergonha de dizer que as esfinges são assustadoras, principalmente de noite, sem luar, e que a esfinge me impressionou. Mando a fotografia – a fotografia é muito mais nítida e mais bela que o original…”

Em uma foto dos soldados brasileiros em tratamento no 45th General Hospital, em que Clarice trabalhou como enfermeira voluntária da Cruz Vermelha, vemos Elza Cansanção Medeiros, ladeada pelo diretor do hospital e pelo cinegrafista. Nós, que tivemos a honra de ouvir a Major Elza, ficamos felizes de encontrá-la junto a uma figura ímpar de nossa literatura, Clarice Lispector. Sentimos orgulho de sermos brasileiros e de termos tão dignas representantes.

Todas as obras aqui citadas são fontes de cultura e de lazer, despertam muito amor e admiração pela humanidade. A linguagem fotográfica, como propõe o filósofo Vilém Flüsser, vai criar redes conceituais capazes de acolher a complexidade da situação atual, de conectar diferentes tempos e de causar a alegria da reinvenção pelo leitor da realidade vivida.



*Mestre em Lingüística Aplicada, membro da Academia de Letras do Vale do Iguaçu (Alvi), professora de Língua e Literatura nos cursos  de Secretariado Executivo e Comunicação Social, e presidente do Conselho Editorial da Uniuv.

Esclareça suas dúvidas. Mande sugestões para esta coluna pelo e-mail prof.fahena@uniuv.edu.br

Esse texto foi originalmente publicado na coluna Questões de Estilo, da edição impressa nº. 2.002, e na edição on-line nº. 502 do Jornal Caiçara, de 4 de julho de 2008.

por: UNIUV

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