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ARTIGO – História da leitura, história da cultura
As ciências humanas têm recebido a influência de um estudioso da história da leitura, palestrante e conferencista, professor na Europa e nos Estados Unidos, intelectual francês, Chartier. Já veio ao Brasil muitas vezes, para proferir palestras.
Vendo a leitura e a escrita como práticas sociais que realmente são, considera a possibilidade de estudar o aspecto cultural da humanidade pelo ângulo da evolução do escrito, sempre relacionado ao momento e aos costumes referentes ao ler e ao escrever.
Sua pesquisa mostra que tipos de interesses aproximam leitores e autores, de gêneros diversos. Foi ele quem serviu de base teórica aos estudos de Emília Ferreiro, sobre o processo de aquisição da escrita, tendo como princípio um ponto plenamente aceito atualmente: o sentido não é totalmente dado nas palavras escritas, mas é construído pelo leitor.
O autor, ao escrever, dá um sentido a sua obra, conforme seu tempo e sua cultura, e os leitores, através dos tempos, vão fazendo interpretações, conforme o suporte, a época, a comunidade que lê.
Todas as variações na leitura e na escrita são geradoras de mudanças de sentido desde os tipos de letras, funcionamento das bibliotecas, formas de venda dos livros, traduções e adaptações de obras clássicas.
A substituição do rolo de papiro pelo livro foi uma revolução no suporte que resultou em mudanças na forma de ler e de ver a leitura, que inclui todo o conhecimento prévio sobre como foi produzido o texto naquele material. Mais radical foi o aparecimento do livro eletrônico, com seu charme de pós-modernidade, rapidez, acessibilidade.
Ao mudar a relação do leitor com o material escrito, há mudanças no sentido, pois o texto existe conforme o modo em que é transmitido. É a questão do gênero e do suporte, estudada por Maingueneau, na Análise do Discurso. Eles não são secundários, mas essenciais à constituição do texto, que surge contendo em si as marcas próprias do suporte e do gênero, e dos leitores previstos, tudo como socialmente convencionado de forma implícita.
Assim, uma notícia para jornal impresso é gerada de forma diferente, se pensada para televisão, rádio, revista ou internet. A forma livro permite leitura mais aprofundada e reflexiva que a forma jornal ou outro suporte. Por isso pode-se dizer que o livro continuará existindo, mesmo com a ampla difusão dos meios eletrônicos.
Chartier notou que, à medida que mudaram os suportes dos textos, mudaram os padrões dominantes de leitura: da leitura em voz alta, perante plateias, à leitura silenciosa (Idade Média); da leitura intensiva (poucas obras selecionadas e clássicas) à extensiva (diferentes autores em grande quantidade).
Como é tendência de nosso tempo, esse estudioso também prioriza as fontes primárias, o singular, o diferente, deixando de focar sua pesquisa nas semelhanças ou continuidades da História da Cultura. Theodore Zeldin, com sua História Íntima da Humanidade, parte, também de relatos de indivíduos – e o resultado é muito interessante, é uma história com vida.
Ler uma obra de épocas mais distantes pode ser comparado a um diálogo entre o bisavô e seu bisneto, cada um com sua visão de mundo e linguagem, experiências diversas. E se entendem. Vale a pena aproximar-nos dos textos de qualquer tempo, para ouvir os rumores da humanidade ali presentes e com eles interagir, criando um sentido. É muito curiosa essa relação cultural amorosa com os antepassados, por meio dos livros.
Mestre em Lingüística Aplicada, membro da Academia de Letras do Vale do Iguaçu (Alvi), professora de Língua e Literatura nos cursos de Secretariado Executivo e Comunicação Social, e presidente do Conselho Editorial da Uniuv.
Esclareça suas dúvidas. Mande sugestões para esta coluna pelo e-mail prof.fahena@uniuv.edu.br
Esse texto foi originalmente publicado na coluna Questões de Estilo, da edição impressa de 8 de maio de 2009.
por: UNIUV
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